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Direitos Humanos

Entenda

Competências

Como dito em outros itens deste site, uma das particularidades dos direitos humanos é o fato de abarcarem uma gama de assuntos que em muito extrapolam os direitos e garantias individuais, assuntos esses por vezes compartilhados com outras áreas, mas todos considerados fundamentais ao se tratar dos direitos da pessoa humana. Sendo assim, ao se pensar nas competências relacionadas às políticas públicas de direitos humanos, muitas vezes será necessário recorrer às competências de outras áreas abordadas neste site, dependendo do tema, por meio da aba “Temas Relacionados” (por exemplo: assistência social, saúde, educação, segurança pública, etc.). O mesmo ocorrerá ao se pensar em estrutura organizacional e de gestão, em financiamento e em legislação básica. Outra peculiaridade dos direitos humanos é a relativização da soberania dos Estados em casos de violação, já que o sistema internacional de proteção desses direitos é mundialmente reconhecido como subsidiário aos sistemas nacionais. Constata-se uma verdadeira internacionalização ou mundialização dos direitos humanos e, em face disso, pode-se observar que há singularidades para legislar sobre direitos humanos não encontradas em nenhuma outra área, bem como para investigar, julgar e, se for o caso, punir violações a esses direitos. Para lidar com essas questões, optou-se por mencionar aqui apenas aquelas competências relacionadas aos direitos humanos de forma ampla ou, ainda, aquelas cuja relação específica com os direitos humanos não será mencionada em outras áreas.
 

 

  • Competência para legislar

    Na Constituição Federal1 não há distribuição clara entre os entes federados — União, Estados, Distrito Federal e Municípios – acerca das competências para legislar especificamente sobre os direitos humanos, dadas as particularidades da área, mencionadas acima e descritas em outros tópicos deste site. A título de ilustração, citam-se alguns exemplos: em se tratando da elaboração e execução de planos nacionais e regionais de desenvolvimento econômico e social, apenas a União pode legislar (competência exclusiva); mas se for matéria relacionada à seguridade social ou diretrizes e bases da educação nacional, também compete à União legislar, porém tal competência é delegável (competência privativa); já no caso do combate às causas da pobreza e aos fatores de marginalização, com a promoção da integração social dos setores desfavorecidos, todos os entes federados podem legislar, inclusive os Municípios, de forma complementar e cooperativa (competência comum); e, em se tratando da previdência social e da proteção e defesa da saúde, compete à União, Estados e Distrito Federal legislarem concorrentemente. Tais exemplos sobre as competências para legislar sobre os assuntos que dizem respeito aos direitos humanos podem ser verificados por meio da análise conjugada dos arts. 21 a 24 e 30 da Constituição Federal, e sua complexidade e amplidão se coadunam, de certa forma, com a transversalidade, a interdependência e a indivisibilidade inerentes a esses direitos.
    Diante disso, é fundamental ter em mente, como já mencionado, que, ao se pensar na legislação básica de direitos humanos, muitas vezes será necessário recorrer à legislação básica de outras áreas abordadas neste site, dependendo do tema, por meio da aba “Temas Relacionados” (por exemplo: assistência social, saúde, educação, segurança pública, etc.). Mas cumpre ressaltar, a título de orientação geral e de esclarecimento, que os direitos humanos a serem observados, respeitados e promovidos estão contidos no próprio corpo constitucional (em especial, nos Títulos I — Dos Princípios Fundamentais — e II — Dos Direitos e Garantias Fundamentais — da Constituição Federal1, mas não apenas); e outros são oriundos dos tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário. Nesse sentido é relevante relembrar o disposto nos seguintes parágrafos do art. 5º da Constituição Federal:

    Art. 5º – (...)
    §2º – Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.
    §3º – Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

     

    Esses dispositivos apontam para uma outra particularidade no que toca à competência para legislar sobre direitos humanos: a forma de incorporação ao ordenamento jurídico nacional das convenções e tratados internacionais ratificados pelo Brasil, aspecto característico da já mencionada internacionalização ou mundialização desses direitos. De modo geral, tem-se que essa incorporação ocorre efetivamente pelas seguintes etapas:

    • negociação e assinatura: realizadas no âmbito dos organismos internacionais e competências do Presidente da República (inciso VIII do art. 84 da Constituição Federal), mas podendo ser delegadas e, na prática, normalmente executadas pelos chefes de missões diplomáticas ou pelo Ministro das Relações Exteriores;
    • mensagem do Presidente ao Congresso Nacional: ato político contendo justificativa para a assinatura e o inteiro teor do documento assinado;
    • decreto legislativo: aprova o texto do documento, passando pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal;
    • promulgação: mediante decreto do Presidente da República, seguida de publicação oficial;
    • envio ao depositário do tratado: seguido de respectivo protocolo e envio de cópia aos demais estados signatários.

    Após a fase da promulgação pelo Chefe do Executivo, que é efetivamente o ato com força de lei, e da publicação oficial, o tratado internacional passa a vincular e a obrigar internamente, com status de lei ordinária. No que se refere aos tratados internacionais que versam sobre direitos humanos, há uma particularidade: segundo prescreve o § 3º2 do art. 5º da Constituição Federal, “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. Na prática, esse dispositivo, acrescentado pela Emenda Constitucional nº 45, de 20043, buscou pacificar polêmica sobre o status desses tratados, e a interpretação mais comum sobre ele tem sido a de que, se um tratado internacional de direitos humanos tiver sido aprovado no Congresso Nacional por rito ordinário e promulgado por decreto legislativo, ele constituirá norma supralegal. Isso significa que ele será incorporado ao ordenamento jurídico nacional com status inferior ao das normas constitucionais, porém acima das leis ordinárias. Porém, se tiver a tramitação e aprovação previstas no § 3º do art. 5º, supramencionado, ele será incorporado ao ordenamento jurídico nacional como emenda constitucional.

    O mesmo art. 5º da Constituição Federal contem, em seu parágrafo 1º, uma outra particularidade relacionada ao ato de legislar sobre direitos humanos: a aplicabilidade imediata das normas que versem sobre direitos e garantias fundamentais (“As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.”). Mais uma peculiaridade, porém contida em outro dispositivo constitucional: no tocante aos direitos e garantias individuais, eles não poderão ser objeto de deliberação de proposta de emenda constitucional que vise a aboli-los, ou seja, integram o rol das chamadas “cláusulas pétreas” da Constituição Federal (art. 60, § 4º, IV4). Isso reveste tais direitos de uma espécie de “intangibilidade” e os relaciona à característica de inviolabilidade inerente aos direitos fundamentais, a qual assegura que normas infraconstitucionais e autoridades públicas não podem desrespeitar nem contrariar tais direitos.

     

    BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Presidência da República.Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 25 fev. 2019.
    2 Art. 5º – (...)
    (...)
    § 3º – Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.” (BRASIL. Constituição (1988)).
    3 BRASIL. Constituição (1988). Emenda constitucional nº 45, de 30 de dezembro de 2004. Altera dispositivos dos arts. 5º, 36, 52, 92, 93, 95, 98, 99, 102, 103, 104, 105, 107, 109, 111, 112, 114, 115, 125, 126, 127, 128, 129, 134 e 168 da Constituição Federal, e acrescenta os arts. 103-A, 103B, 111-A e 130-A, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/Emendas/Emc/emc45.htm >. Acesso em: 07 fev. 2013.
    4 Art. 60 – (...)
    § 4º – Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:
    (...)
    IV – os direitos e garantias individuais.” (Brasil. Constituição (1988)).

     

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  • Competência para investigar, julgar e punir a violação dos direitos humanos em âmbito nacional

    O controle sobre a observância e o respeito aos direitos humanos dá-se, em âmbito nacional, por meio dos instrumentos previstos na Constituição Federal. Trata-se, na verdade, de garantias, compostas por recursos e meios jurídicos os quais visam, para além da descrição, no corpo constitucional, dos direitos da pessoa humana considerados fundamentais (direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais), assegurar que a violação a eles seja evitada e, caso ocorra, seja averiguada e punida, se couber. Nesse sentido, elas abrangem, essencialmente: o acesso à justiça, o direito de petição, o direito de ampla defesa, a proibição de tribunais de exceção, a proibição de prisões arbitrárias, a proibição da pena de morte e de caráter perpétuo, o habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança, o mandado de injunção, a ação popular, a ação civil pública, além da assistência jurídica integral gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Dependendo do caso, será determinado o recurso ou meio jurídico aplicável bem como a competência para investigar, julgar e punir a violação, em âmbito nacional.
    É relevante apontar que, mediante a conjugação de certos dispositivos constitucionais (§§ 1º e 3º do art. 5º1), há a possibilidade de incorporação imediata, pelo Poder Judiciário brasileiro, das normas internacionais sobre direitos humanos recepcionadas pelo ordenamento jurídico nacional. Ressalta-se também o disposto no art. 109, V-A e § 5º, da Constituição Federal2, que determina que, nos casos onde é verificada a hipótese de grave violação dos direitos humanos, o Ministério Público, por meio do Procurador-Geral da República, poderá suscitar junto ao Superior Tribunal de Justiça o deslocamento de competência para a Justiça Federal em qualquer fase do processo ou do inquérito, em especial se se verificar que há falha ou algum tipo de comprometimento na averiguação da violação e na proteção aos direitos humanos3. Trata-se da denominada federalização dos crimes contra os direitos humanos, a qual visa, nesses casos específicos previstos pela Constituição Federal, assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte.
     

    1 “Art. 5º —  (...)
    § 1º — As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.
    (...)
    § 3º — Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.” (Brasil. Constituição (1988)).
    2 “Art. 109 — Aos juízes federais compete processar e julgar:
    (...)
    V-A — as causas relativas a direitos humanos a que se refere o § 5º deste artigo;
    (...)
    § 5º — Nas hipóteses de grave violação de direitos humanos, o Procurador-Geral da República, com a finalidade de assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, poderá suscitar, perante o Superior Tribunal de Justiça, em qualquer fase do inquérito ou processo, incidente de deslocamento de competência para a Justiça Federal.” (Brasil. Constituição (1988)).
    3 Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/flaviapiovesan/piovesan_federalizacao.html>. Acesso em: 4 mar. 2013.

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  • Sistema internacional de responsabilização pela violação dos direitos humanos

    Conforme mencionado em outros pontos deste site, existe um sistema internacional de proteção dos direitos humanos o qual opera mediante a atuação de instituições internacionais, compostas por conselhos, comissões e cortes a cargo de garantirem que as violações aos direitos humanos previstos nos documentos internacionais sejam analisadas, investigadas e, se for o caso, julgadas pelos tribunais competentes.
    De modo geral, os conselhos e comissões constituem órgãos intergovernamentais de natureza política e consultiva, a cargo da proteção e da promoção dos direitos humanos. Atuam mediante discussões e interpretações relacionadas às convenções e tratados das organizações às quais estão vinculados bem como mediante a análise e encaminhamento de reclamações e/ou de petições sobre violação de direitos e de outras medidas cabíveis nesses casos1 (como recomendações, medidas cautelares, investigações, soluções amistosas e assim por diante)2.
    Já as cortes ou tribunais são os principais órgãos de jurisdição supranacional, subsidiária às respectivas jurisdições nacionais dos Estados signatários de tratados, convenções e acordos internacionais globais ou regionais, podendo também exercer a atividade consultiva ao emitirem análises que esclareçam dúvidas sobre dispositivos das convenções e acordos internacionais com os quais lidam. Nesse sistema de jurisdição supranacional, há a possibilidade de os Estados serem, na pessoa da União, investigados e julgados, se for o caso, pelas instâncias cabíveis, determinadas pelas instituições internacionais cuja competência tais Estados aceitaram. Em tais situações, cabe inclusive responsabilização por omissão dos Poderes do Estado, juntos ou separadamente. Ainda no âmbito do sistema internacional de responsabilização pela violação de direitos humanos, está previsto o julgamento de indivíduos pelo Tribunal Penal Internacional, no caso de crimes de lesa-humanidade.
    É relevante ressaltar o disposto no art. 5º, § 4º, da Constituição Federal: “O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão.”. Nesse sentido, cumpre aqui relembrar a aceitação, pelo Brasil, da competência da Corte Interamericana de Direitos Humanos em matéria contenciosa em 1998 (a qual pode julgar Estados) e a ratificação do Estatuto de Roma, que criou o TPI, em 2002 (o qual pode julgar indivíduos).
    A Corte Interamericana de Direitos Humanos integra o sistema da Organização dos Estados Americanos — OEA —, o qual foi criado por meio da Convenção Americana dos Direitos do Homem (de 1969, conhecida como Pacto de San José da Costa Rica3). É composta por sete juízes eleitos, nacionais dos Estados-membros da Organização, de acordo com os requisitos previstos na Convenção. Sua competência é também definida pelas disposições da Convenção e aplicável aos Estados que tenham reconhecido sua jurisdição e, nos casos em que considere que tenha de fato havido uma violação dos direitos humanos, serão determinadas as medidas pertinentes à restauração do direito violado, cabendo, como já dito, inclusive a responsabilização por omissão dos Poderes do Estado, juntos ou separadamente. A Corte Interamericana de Direitos Humanos também pode exercer atividade consultiva, mediante análises que esclareçam dúvidas relacionadas aos dispositivos da Convenção.
    Já o Tribunal Penal Internacional — TPI — é, segundo o art. 1º do Estatuto de Roma4, que o criou, uma “instituição permanente, com jurisdição sobre as pessoas responsáveis pelos crimes de maior gravidade com alcance internacional”, sendo “complementar às jurisdições penais nacionais”. Sua competência, de acordo com o art. 5º do Estatuto, “restringir-se-á aos crimes mais graves, que afetam a comunidade internacional no seu conjunto (…): a) o crime de genocídio; b) crimes contra a humanidade; c) crimes de guerra; d) o crime de agressão”; e os artigos que lhe seguem especificam cada um desses crimes5. Está previsto no Estatuto, em seu art. 2º, o estabelecimento da relação entre o TPI e as Nações Unidas por meio de “um acordo a ser aprovado pela Assembleia dos Estados Partes no presente Estatuto e, em seguida, concluído pelo Presidente do Tribunal em nome deste”.
    É importante observar que na Organização das Nações Unidas — ONU — não há uma corte especializada em questões relacionadas aos direitos humanos, mas sim uma Corte Internacional de Justiça, sediada na Holanda, em Haia, à qual podem recorrer os países que ratificaram seu Estatuto (o qual integra a Carta das Nações Unidas6). Trata-se do principal órgão judiciário da ONU, composto por 15 juízes eleitos pela Assembleia Geral e pelo Conselho de Justiça da própria ONU para mandatos de nove anos, a cargo de decidirem sobre controvérsias e disputas entre os Estados-membros e de emitirem pareceres consultivos sobre questões diversas levantadas pelas instituições das Nações Unidas. No entanto, tribunais criminais ad hoc já foram constituídos para analisar e julgar casos emblemáticos como: os Tribunais Penais Internacionais para a antiga Iugoslávia e para Ruanda, a Corte Especial para Serra Leoa, as Câmaras Especiais na Corte do Camboja e o Tribunal Especial para o Líbano.
    Vale mencionar que a ONU possui também: um Conselho de Direitos Humanos sem natureza jurisdicional7, órgão integrante do sistema das Nações Unidas que recebe denúncias e toma providências quando ocorre alguma violação de direitos humanos; e um Comitê de Direitos Humanos8, órgão de tratado e de controle criado pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (art. 28 e seguintes), de 19929, a cargo de analisar os relatórios apresentados pelos Estados-partes, relatórios esses que devem conter informações sobre as medidas adotadas por esses Estados para tornar efetivos os direitos reconhecidos pelo Pacto e sobre o progresso alcançado no gozo desses direitos. Ressalta-se que o Conselho de Direitos Humanos criou em 2007 um instrumento denominado Mecanismo de Revisão Periódica Universal, com o objetivo de acompanhar a implementação dos direitos humanos pelos Estados que integram a ONU. Com base em relatórios redigidos pelos Estados, pela sociedade civil e pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos, avalia-se o grau de cumprimento das obrigações internacionais assumidas por esses Estados com relação aos direitos humanos. O Brasil apresentou seu primeiro relatório em 2008, tendo sido elaborado sob coordenação conjunta da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República — SDH/PR — e do Ministério das Relações Exteriores10.
    Já a OEA tem uma Comissão Interamericana de Direitos Humanos11, órgão intergovernamental sem natureza jurisdicional que tenta realizar acordos com países violadores de direitos humanos e que decide se alguma das denúncias por ela recebidas será ou não encaminhada para a já mencionada Corte Interamericana de Direitos Humanos, esta a cargo dos julgamentos. Porém, no âmbito da OEA, geralmente não são indivíduos que buscam solução em casos de violação, mas sim organizações de direitos humanos em nome desses indivíduos, já que os requisitos de admissibilidade são complexos e é importante um suporte técnico qualificado.
    Ainda na esfera desses sistemas supranacionais, há outros mecanismos de controle e supervisão internacional sobre o respeito e a proteção aos direitos humanos, como as reclamações ou petições, os relatórios e a determinação de fatos ou investigações. As petições podem ser encaminhadas às instituições internacionais por indivíduos, grupos da sociedade civil organizada ou mesmo por seus Estados-membros e constituem reclamações ou queixas sobre alguma forma de violação. Cada instituição internacional possui um procedimento previsto para sua atuação ao ser provocada por tais petições, de acordo com os tratados, convenções e pactos que possuem, ratificados por diversos países.
    Um bom exemplo do mecanismo das petições: o Centro pela Justiça pelo Direito Internacional, o Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher e Maria da Penha Maia Fernandes fizeram denúncia à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA sobre as agressões e a tentativa de homicídio sofridas por Maria da Penha, cometidas por seu marido, que só foi punido após 19 anos do julgamento e cumpriu pena de apenas 2 anos, em regime fechado. Após análise da denúncia, a Comissão decidiu encaminhá-la à Corte Interamericana de Direitos Humanos, órgão judicial autônomo da OEA, constituindo, então, o caso nº 12.051. Este, após julgado por essa Corte, foi um dos alicerces da Lei Federal 11.340, de 200612, conhecida como Lei Maria da Penha, a qual aumentou o rigor das punições nos casos de agressões domésticas contra as mulheres no Brasil, e culminou na condenação do Estado do Ceará a indenizar Maria da Penha em cerca de 20 mil dólares, em 2001. Essa indenização, no entanto, só foi reconhecida e efetivada em 2008 pelo governo cearense.
    Já os relatórios e determinação de fatos ou investigações, ambos previstos em pactos internacionais e/ou regionais, são formas de controle ex officio. Apesar de haver uma certa padronização, os relatórios são de tipos variados, sendo elaborados por organismos internacionais diversos, como a ONU e a OEA e a organização não governamental Human Rights Watch, a partir de pesquisas e averiguações em certos países. Há, também, relatórios periódicos, elaborados pelos países membros de uma organização internacional como exigência em uma situação específica, para acompanhamento do cumprimento de algum pacto. A determinação de fatos ou investigações, realizadas in loco por missões especiais criadas por resolução dos organismos internacionais, podem ser em base permanente ou ad hoc, temáticas ou por países. As de base permanente estão relacionadas às petições ou aos relatórios, e servem ao propósito de averiguar uma denúncia específica de violação dos direitos humanos, sendo, portanto, institucionalizadas e realizadas mediante aquiescência e colaboração do Estado envolvido. Vale ressaltar que não há hierarquia entre relatórios e investigações, sendo eles complementares.
     

    1 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. (Washington, Estados Unidos.) Estatuto da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Aprovado pela resolução AG/RES. 447 (IX-O/79), adotada pela Assembléia
    Geral da OEA, em seu Nono Período Ordinário de Sessões, realizado em La Paz, Bolívia, em outubro de 1979. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/t.Estatuto.CIDH.htm>. Acesso em: 17 out. 2013.
    2 NAÇÕES UNIDAS (ONU). Conselho de Direitos Humanos. Disponível em: < http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/HRC/Pages/HRCIndex.aspx >. Acesso em: 30 out. 2013.
    3 CONFERÊNCIA ESPECIALIZADA INTERAMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS, 1969, San José da Costa Rica. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (1969). Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/instrumentos/sanjose.htm>. Acesso em: 24 out. 2013.
    4 BRASIL. Decreto nº 4.388, de 25 de setembro de 2002. Promulga o Estatuto de Roma do Tribunal Penal
    Internacional. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/2002/D4388.htm >. Acesso em: 18 mar. 2013.
    5 O primeiro veredito do TPI ocorreu em 2012, condenando o congolês Thomas Lubanga Dyilo pelo recrutamento de crianças-soldado nas Forças Patrióticas para a Libertação do Congo entre setembro de 2002 e agosto de 2003.
    6 CONFERÊNCIA DAS NAÇÕES UNIDAS SOBRE ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL, 1945, São Francisco. Carta das Nações Unidas. São Francisco: ONU, 1945. disponível em: < http://www.oas.org/dil/port/1945%20Carta%20das%20Na%C3%A7%C3%B5es%20Unidas.pdf >. Acesso em: 26 mar. 2013.
    7 NAÇÕES UNIDAS (ONU). Conselho de Direitos Humanos. Disponível em: < http://www.ohchr.org/EN/HRBodies/HRC/Pages/HRCIndex.aspx >. Acesso em: 26 mar. 2013.
    8 COMITÊ de Direitos Humanos – HRC. In: ABC da ONU Organização das Nações Unidas. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/abc/onu/comites_dh.htm>. Acesso em 30 out. 2013.
    9 BRASIL. Decreto nº 592, de 6 de julho de 1992. Atos Internacionais. Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos. Promulgação. (Promulga o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos.) Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D0592.htm>. Acesso em: 14 out. 2013.
    10 EXAME de revisão periódica universal. 23p. Disponível em: http://portal.mj.gov.br/sedh/co/internacional/rpu.pdf
    . Acesso em: 30 out. 2013.
    11 COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. (Washington, Estados Unidos.) Estatuto da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Aprovado pela resolução AG/RES. 447 (IX-O/79), adotada pela Assembléia
    Geral da OEA, em seu Nono Período Ordinário de Sessões, realizado em La Paz, Bolívia, em outubro de 1979. Disponível em: <http://www.cidh.oas.org/basicos/portugues/t.Estatuto.CIDH.htm>. Acesso em: 17 out. 2013.
    12 BRASIL. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm >. Acesso em: 13 mar. 2013.

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